Eletricista desempregado foi preso ao tentar furtar 2 kg de carne para o filho.
Ele teve fiança e compras pagas por policiais que atenderam a ocorrência.
Do G1 DF
Preso por tentar furtar 2 kg de carne de um mercado para ter o que comer e ser liberado após uma policial pagar a fiança, o eletricista desempregado Mário Ferreira Lima se disse arrependido do crime e classificou a própria situação como "desespero". "A pior que coisa existe na vida da gente é não poder alimentar o próprio filho", disse.
Ele foi preso nesta quarta-feira (13) em um mercado de Santa Maria e sensibilizou os policiais civis, que decidiram dar um final diferente à história. Além de pagar a fiança, eles fizeram compras para Lima, que contou em depoimento ter praticado o crime para alimentar o filho de 12 anos. O homem cria o menino sozinho desde que a mulher se mudou para a casa de um filho mais velho, de outro casamento, para se recuperar das sequelas de um acidente.
O desempregado contou que se confundiu com as datas e achou que já tivesse caído na conta os R$ 70 que recebe mensalmente por meio do Programa Bolsa Família. Ele foi então ao mercado comprar banana, pão e carne.
Na hora de passar as compras no caixa, o homem descobriu que o valor que tinha levado – R$ 7 – era insuficiente e tentou esconder a carne na bolsa. Os 2 kg do alimento custavam R$ 26. A ação foi flagrada pelas câmeras de segurança, e o dono do estabelecimento não aceitou as desculpas do ladrão e acionou a polícia.
O agente da Polícia Civil Ricardo Machado conta que o desempregado desmaiou pouco depois de chegar à delegacia, quando ouviu que ficaria preso. Questionado se estava bem, o homem respondeu que estava sem comer havia dois dias, porque deixou o filho consumir sozinho o pão que restava em casa, e que estava preocupado porque não havia alguém para cuidar do menino.
Machado terminou de ouvir a história do suspeito – que narrou ter perdido o emprego com carteira assinada por ter precisado acompanhar a mulher nos oito meses em que ela ficou internada em coma no hospital – e procurou os colegas. “Dei a ele R$ 30 para pagar a carne e depois fui contar aos colegas o que estava acontecendo no plantão. Ficou todo mundo comovido, e logo um tirou R$ 5, outro R$ 10, outro R$ 20 do bolso”, lembra.
A ocorrência foi registrada na delegacia do GamaOeste, e a fiança foi estipulada em R$ 270. Sensibilizada, uma agente pagou sozinha o valor, enquanto os colegas arrecadavam mais dinheiro para comprar mantimentos para o ladrão.

Os agentes acompanharam o homem até a casa dele. Machado diz que ele “não conseguia acreditar e não parava de agradecer”. “Ele cuida da casa e do menino pela manhã e à tarde vai atrás de bicos, mas não conseguiu nada nos últimos dois meses. A gente sabe que o crime não é certo, mas eu me ponho no lugar. Imaginei a minha filha passando fome. O que eu não faria nessa situação?”, questionou.
Futuro
O eletricista disse esperar nunca mais passar por isso e afirmou que deseja conseguir um emprego e restituir a família.
A agente da Polícia Civil Kelen Lemos, que também colaborou na vaquinha, conta que nada justifica o crime. “Em nenhum momento a intenção é de fomentar o crime [mas não tem como não se comover e não tentar ajudar].”
O presidente da Comissão de Ciências Criminais e Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil, Alexandre Queiroz, disse que a defesa pode buscar enquadrar o caso do eletricista como "estado de necessidade", se ficar comprovado que ele não tinha mesmo outras condições de conseguir alimento.
O advogado disse, no entanto, ser importante que as autoridades fiquem alertas às mazelas sociais e que casos como esse não sejam estimulados.
"A meu ver os policiais agiram acertadamente, até porque eles cumpriram com as formalidades. E é importante deixar isso claro, eles cumpriram com as formalidades. Como cidadãos foi que eles se sensibilizaram e pagaram a fiança, e o policial, pelo tipo de trabalho que exerce, tem essa sensibilidade de enxergar as pessoas. Mas não se pode esquecer que houve um crime", declarou.