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sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Contra o preconceito, catador de recicláveis se forma em Direito no PR

Edson Manfroi Júnior mora em Francisco Beltrão, no sudoeste do estado.'Um exemplo para todos', diz coordenador do curso que ele frequentou.
Do G1 PR
Edson Manfroi em uma aula durante a faculdade de Direito, que acabou de conluir (Foto: Arquivo pessoal)


Com 47 anos, Edson Manfroi Júnior acabou de se formar no curso de Direito pela Universidade Paranaense (Unipar). Porém, a idade não é a única característica que chama a atenção nesse morador de Francisco Beltrão, no sudoeste do Paraná. Manfroi trabalha há 12 anos como catador de recicláveis e sempre quis cursar uma faculdade. Para ele, é uma forma de combater o preconceito que sofreu. “Tem que haver justiça, é muita corrupção, muita discriminação”, diz. O objetivo foi concluído e a colação de grau foi este mês.

A discriminação que viveu foi uma motivação para escolher o curso de Direto e lutar pelo que acredita. “A gente sofre porque vive sujo”, diz. “Cada vez que eu entrava no supermercado o gerente mandava um funcionário me seguir. Essa é uma das questões, mas tem muitas outras que aconteciam porque eu andava desarrumado por causa do meu trabalho”, completa.

Mesmo já formado, ele continua na mesma profissão. Começa a trabalhar às 4h da manhã recolhendo recicláveis pelas ruas da cidade e só para às 17h30. Durante os cinco anos da faculdade a rotina teve que ser ampliada para conquistar o objetivo. Depois do trabalho, Manfroi seguia para a faculdade e só voltava para casa, em um bairro pobre da cidade, por volta da 1h. “A maior dificuldade foi o cansaço físico, trabalhar de manhã e de tarde, e à noite estudar”, afirma. A faculdade particular foi paga com recursos próprios. No último ano a mensalidade chegou a mais de R$ 1 mil e por vezes, algumas parcelas chegaram a atrasar.
O colega de curso Vinícius Murari Borges lembra que em alguns dias o cansaço vencia o catador. "Era nítido que ele tinha uma vida sofrida. Não raro, vinha para as aulas sujo de graxa e óleo, com as mãos sangrando de algum corte que fizera carregando lixo. Às vezes ele chegava tão cansado na sala que dormia sentado durante a aula", conta.
Bom aluno
O coordenado do curso, Alexandre Magno Augusto Moreira, acompanhou Manfroi desde o primeiro ano da faculdade. Foi professor dele até o terceiro ano, antes de assumir a coordenação do curso. “Para nós, no primeiro ano foi um choque porque era uma pessoa que chegava com as mãos sujas, pegava nos cadernos e nas provas, e nós ficávamos nos questionando. Aos poucos ele foi contando a história dele e nós fomos entendendo. É uma superação, foi um cara que trabalhou o dia inteiro, embaixo de sol, e a noite ainda aguentava aulas teóricas”, lembra.

Moreira diz que no começo o aluno apresentava dificuldades de interpretação e escrita. Teve que fazer cursinhos complementares, mas com o tempo se destacou entre os alunos. “É muito gratificante ver o crescimento pessoal, técnico e profissional dele. Ele teve dificuldades, mas o ponto positivo foi a superação. Se esforçou fisicamente e psicologicamente e isso o diferencia dos demais”, salienta o professor. "Apesar de todas as dificuldados ele sempre foi muito esforçado e dedicado nos estudos. Era um exemplo para todos", completa o colega Borges.
Edson com o professor Inezil Penna Marinho
Junior (Foto: Arquivo pessoal)

Futuro advogado

Mesmo seguindo no trabalho com recicláveis, Manfroi tem a certeza que o futuro vai mudar. Para isso, já traçou metas e começou a se preparar. O próximo passo é fazer o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Depois de passar no exame, ele pretende começar a atuar na área. “Eu vou montar um escritório no meu bairro para ajudar os moradores que precisam. Tem muita gente carente aqui”, planeja Manfroi, que acredita na aprovação no exame.

Chegar até aqui já é uma grande realização para quem enfrentou muitas dificuldades na vida. “É mais do que um sonho porque eu saí da favela, e hoje tenho uma casinha, tenho um trabalho para sustentar meus filhos e consegui fazer a faculdade”. Manfroi conta que deois que ser formou notou que as coisas mudaram ao seu redor. “O povo olha com outros olhos para a gente, já mudou bastante porque as pessoas sabem que eu estudei”, afirma.

Turma de Direito de Edson se formou este mês (Foto: Arquivo pessoal)


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